O importante não é aquilo que fazem de nós, mas o que nós mesmos fazemos do que os outros fizeram de nós.
JEAN-PAUL SARTRE

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

MARIA GABRIELA LLANSOL (1931-2008)



Maria Gabriela Llansol é provavelmente a mais inclassificável das escritoras portuguesas. Escreveu «nas margens da língua» e «fora da literatura», e viveu vinte anos no exílio da Bélgica, onde colheu inspiração para uma obra sem paralelo na literatura portuguesa.
O núcleo principal da sua obra inicia-se com duas triologias (Geografia de Rebeldes e O Litoral do Mundo) que ensaiam uma releitura da história intelectual e espiritual da Europa, com recurso à metamorfose ficcional de uma ampla galeria de figuras, das beguinas medievais a Camões, de Hölderlin a Nietzche ou de Bach a Fernando pessoa. Depois disso, envereda por uma «ordem figural do quotidiano» em cerca de vinte livros reveladores de uma escrita visionária e intensa de grande originalidade, que lhe valeu por duas vezes o Grande Prémio de Romance e Novela da APE, e que faz juz ao prognóstico de Eduardo Lourenço segundo o qual «Llansol será o próximo grande mito literário português, por paralelo com o Próprio Pessoa». Deixou um imenso espólio manuscrito de milhares de páginas inéditas, em curso de publicação (Assírio & Alvim).
(VAI SER HOMENAGEADA EM MARÇO NO CCB)
Muito pouco se encontra na Internet sobre a Gabriela Llansol, encontrei o site
http://espacollansol.blogspot.com/, de onde transcrevi o que escrevi e que me suscitou muito interesse em conhecer a sua obra.



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Não há mais sublime sedução do que saber esperar alguém.
Compor o corpo, os objectos em sua função, sejam eles
A boca, os olhos, ou os lábios.
Treinar-se a respirar
Florescentemente.
Sorrir pelo ângulo da malícia.
Aspergir de solução libidinal
os corredores e a porta.
Velar as janelas com um suspiro próprio.
Conceder
Às cortinas o dom de sombrear.
Pegar então num
Objecto contundente e amaciá-lo com a cor.
Rasgar
Num livro uma página estrategicamente aberta.
Entregar-se a espaços vacilantes.
Ficar na dureza
Firme.
Conter.
Arrancar ao meu sexo de ler a palavra
Que te quer.
Soprá-la para dentro de ti ----------
-------------até que a dor alegre recomece.
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Eu estava habituada a vir para casa com um velho amigo
Que me punha a mão nos ombros.
Eu raramente tropeçava
Porque dele irradiava o calor das macieiras e a paz das Tílias.
Era a árvore dos meus passos.
E, regressando a casa,
Regressava à Paisagem que humana me fazia.
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maria gabriela llansolo começo de um livro é precioso assírio & alvim2003
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O texto é a única forma de identificar o sexo e a humanidade de alguém porque, ó poeta estranho, o sexo de alguém, é a sua narrativa. A sua, ou a que o texto conta, no seu lugar. Assim o sexo será como for o lugar do texto.

Quando se deseja alguém, como tu desejas Infausta,
e ela deseja Johann,
é o seu lugar cénico que se deseja,
os gestos do texto que descreve no espaço
e chamar-lhe precioso companheiro;
de mim, direi que fui uma vez enviado,
trouxeste a frase que nunca antes leras,
o meu corpo a disse,
e não reparaste que ficaste com ela escrita.

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