O importante não é aquilo que fazem de nós, mas o que nós mesmos fazemos do que os outros fizeram de nós.
JEAN-PAUL SARTRE

domingo, 17 de outubro de 2010

HERBERTO HELDER - POESIA E PROSA



Os Animais CarnívorosI
Dava pelo nome muito estrangeiro de Amor, era preciso chamá-losem voz - difundia uma colorida multiplicação de mãos, e apareciadepois todo nu escutando-se a si mesmo, e fazia de estátua durante umparque inteiro, de repente voltava-se e acontecera um crime, os jornaisdiziam, ele vinha em estado completo de fotografia embriagada,
descobria-se sangue, a vítima caminhava com uma pêra na mão, a boca estavaimpressa na doçura intransponível da pêra, e depois já se não sabia oque fazer, ele era muito belo, daquela espécie de beleza repentina eurgente, inspirava a mais terrível acção do louvor, mas vinha comer àsnossas mãos, e bastava que tivéssemos muito silêncio para isso, e entãoos dias cruzavam-se uns pelos outros e no meio habitava uma montanhaintensa, e mais tarde às noites trocavam-se e no meio o que existia agoraera uma plantação de espelhos, o Amor aparecia e desaparecia em todoseles, e tínhamos de ficar imóveis e sem compreender, porque ele erauma criança assassina e andava pela terra com as suas camisas brancasabertas, as suas camisas negras e vermelhas todas desabotoadas.


Herberto Helder
Poesia Toda
1979
Assírio & Alvim

Um comentário:

  1. Belíssimo este texto do Herberto, simplesmente assim, tão belo.

    Admiro muito o seu trabalho Manú, é fabuloso o seu Blog.

    Cumpts!

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